Desde que assumiu o comando da agência regulatória norte-americana, a Federal Communications Commission (FCC), Ajit Pai se dedicou a desfazer, aos poucos, boa parte das medidas do chairman anterior, Tom Wheeler. A meta principal é a de anular a reclassificação da banda larga dentro da legislação de serviços essenciais (Title II) – a ideia é a de classificá-la como Title I, sujeita a regulações mais brandas e com atuação menor da FCC, deixando mais a cargo da Federal Trade Commission (FTC). Na prática, isso significa acabar com as regras da Open Internet, relegando às próprias empresas a opção de adotar (ou não) a neutralidade de rede. Criada em 2011 para defender direitos do usuário na Internet, a iniciativa Fight For The Future reuniu apoio de diversas empresas digitais e de conteúdo, como Netflix e Twitter, promovendo uma campanha para pressionar congressistas nos Estados Unidos a votar contra a proposta atual da Comissão.
Um dos sócios fundadores e diretor executivo da FFTF, Holmes Wilson, explica que desde a reclassificação da banda larga em 2015, durante a administração Barack Obama, os provedores continuaram a fazer lobby com a liderança do partido Republicano, o mesmo do presiedente Donald Trump. "Não porque é uma coisa de matéria de direita ou esquerda, na real o eleitorado americano, republicano ou democrata, ambos apoiam a neutralidade de rede em pesquisas, mas o lobby tem força positiva no Republicano", explicou ele a este noticiário.
Os esforços da entidade são também de concentrar no próximo dia 13 de julho um ato em conjunto para pressionar os congressistas após a fase da consulta pública, que encerra nessa mesma época. Até meados de agosto, o processo entra em um período de comentários. Depois, a FCC vai formular modificações ao projeto de lei, que segue então para votação. Tudo deverá desenrolar até o final do ano. Segundo Wilson, a iniciativa conta com apoio de diversos congressistas, incluindo republicanos. "Mas tem pouca iniciativa para se opor publicamente ao FCC neste momento", analisa.
Há, entretanto, esperança que os políticos mostrem constrangimento após a forte repercussão negativa da votação "muito desastrosa e não popular" que aprovou a revogação das medidas de garantia à privacidade do usuário de banda larga junto a provedores de acesso. "O partido Republicano está vulnerável, porque é a liderança deles na FCC que está adiantando essa coisa que não é nada popular", ressalta. Assim, espera poder pressionar os congressistas de todo os Estados Unidos enquanto trabalha junto ao público de forma didática com o conceito de neutralidade, aproveitando também a própria percepção do consumidor norte-americano na relação com provedores de cabo. "Quando as pessoas entendem o que significa, a grande maioria apoia", diz Holmes Wilson. "As medidas que eles (os republicanos) estão propondo claramente admitem a possibilidade de provedores fazer priorização paga", alega, chamando a tática de extorsão por aceitar serviços em uma "via rápida", relegando o restante de quem não subsidia a uma conexão lenta e instável. Essa posição a favor da neutralidade de rede é corroborada pelo ex-chairman da Comissão, Tom Wheeler.
Segundo Wilson, a manifestação teve pouco tempo para se organizar porque a FCC "avançou mais rápido do que todo mundo antecipou", mas considera ter tido sorte de envolver grandes sites e empresas na iniciativa, além de mais de mil startups em todos os estados norte-americanos. "Então estamos ganhando tração, mas claro que estamos trabalhando para conseguir mais participantes, e cada semana anunciamos mais", declara. "Minha esperança seria de ter todas (as empresas de Internet), não tem um site ou serviço que não tenha motivo para participar, pois isso afeta a Internet como um todo", conclui.
Exceções
Wilson considera a prática do zero-rating como outro campo de batalha, mas reconhece que era um ponto sem regras claras. Na opinião do diretor-executivo da Fight For The Future, há formas de utilizar a prática – como em descontos para incentivar o uso da banda larga fora do horário de pico, desde que tratando todos os conteúdos de forma igualitária, e não apenas beneficiando alguns serviços ou aplicativos. No formato atual, com o zero-rating liberado pela FCC de Ajit Pai, ele considera "muito perigoso" por dar ao provedor o controle e "o mesmo poder de intimidação que a priorização paga dá em relação às empresas de Internet". Enxerga ainda o zero-rating e a priorização paga como incentivos contrários e anticompetitivos. "Ambos têm um efeito perverso no provedor, incentivando-o a fazer um serviço terrível justamente para fazer parecer (o acesso patrocinado) mais valoroso."
BRUNO DO AMARAL | bruno@teletime.com.br